29.11.06

Premissas Pessoais. O reencontro.

"Ela estava no espaço. Depois de jogar tudo aquilo que não servia fora, sentia-se livre, uma alegria nostálgica, daquelas que se sorri querendo chorar e se sente plena com um imenso vazio. Não estava enganada, era a liberdade, ainda que seja meio sem rumo. Não desejava mais olhar para trás, sabia que iria encontrar em seus calcanhares apenas uma sombra. Sombra de algo que foi bom e passou, deixando destroços e rasgos irreparáveis, porque não se foi sem antes devastar cada pedaço que estava inteiro. Agora não sobrou muito o que remedar, a dor dilacerante ia durar, mas passaria, ela sabia disso. Dava o primeiro passo depois de se levantar, e caminhar sem olhar para o lado e perceber que alí existe um espaço que antes fora ocupado por alguém, por sonhos, por alegrias, mas que agora se transformou em agonia, ainda é difícil.Olhou para dentro, viu mais do que poderia ver, percebeu que ao amar deve-se doar-se por inteiro, mas é sempre bom guardar a parte mais importante, a base da alma, porque se um dia tudo chegar ao fim, saberá que existe um ponto de onde recomeçar. Era isto o que fazia agora e nada iria impedir este recomeço. Viu as luzes de seus sonhos e aprendeu que deles nunca se deve desistir, percebeu uma luz imensa e esta luz era si mesma. Luz que ficou trancada durante muito tempo e que escondeu de tudo e de todos, até mesmo de si. Era bela. Porque escondia então esta luz? Lembrou-se dos motivos e eram muitos. Aprendeu a não mostrar aos outros o que é muito valioso, viu muitos sofrerem e sofreu muito também, aprendeu que as pessoas são egoístas e invejosas, poderiam querer roubar esta luz ou então tentarem apagá-la. Viu muito isso acontecer e o mundo mostrava isso o tempo inteiro, o mundo é um caos no qual todos estamos mergulhados e precisamos ser cuidadosos. A vida é feita de competição precisamos ser duros, cultivar os amigos, desde que eles nos dêem sempre o que precisamos, caso contrário não é amizade. Estas eram as premissas que ela aprendeu e a que todos usam e respeitam. Por que então apesar de tudo isto ainda sofria? Por que este medo terrível ainda a persegue? Aprendeu tudo, mas esqueceu as premissas pessoais, aquelas que ficaram esquecidas no tempo, e que todos fizeram questão de apagar. A luz aumentava cada vez que sentia-se um pouco mais forte, precisava encontrar-se, encontrar aquela garotinha de abraços carinhosos e sinceros, que sorria para iluminar a tristeza alheia sem saber que com isso também se iluminava. Encontrar a menininha que sabia perdoar a si mesma pelos tropeços e que sempre estendia a mão para ajudar e ser ajudada, por saber que a cooperação é melhor que a competição, embora as duas palavras comecem e terminem com as mesmas letras. Estava ela próxima da luz, estava no espaço e sorria, e chorava, e encontrava esperança, e servia-se dela para levantar-se. Percebia assim a garotinha diante dela e sua luz fundia-se à da outra e as duas tornavam a ser uma só, ela tornava a ser ela mesma. Caminhando de novo, um passo de cada vez, mas agora mais firme e feliz."

Texto gentilmente cedido por Mago.
*Meu amigo Mago é casado, mora em Osasco-SP, é São Paulino e se apaixona por tudo (vide post anterior, rs).

Assim eu Fico Sem Jeito


Meu antigo blog foi destaque na página do Mago. Deletei, criei um novo endereço mas ele insiste em me acompanhar. Transcrevo aqui o carinho que dele recebi, em forma de texto. Ei-lo:

"Incoerente, solteira, tímida, organizada, lúcida, inteligente, amiga presente com ou sem corpo, já que mesmo longe, aqui está em pensamento. Encontrei-a por acaso, eu amo o acaso , apesar de não acreditar nele. A verdade é que através de uma pesquisa de minha esposa cheguei ao blog dela e assim que li alguns textos, me apaixonei (as pessoas dizem que me apaixono por tudo, o que não acho ser verdade). Agora não consigo parar de lê-la um só dia. Sua página é muito mais que um simples blog, é um lugar aconchegante, organizado e carinhoso , que acolhe e faz refletir, como um colo de mãe. "Menina", a dona dele, é simplesmente demais, e deixa o blog com o jeito e a face dela, belo e transparente. Eis o destaque da Semana. Páro aqui, já que sou propenso a falar demais quando me apaixono."


A partir de agora devo ter convidados, vez por outra, neste blog. O primeiro visitante ilustre não poderia ser outro. Com vocês, no próximo post: Mago.

1.11.06

Sobre Taças e Cálices


"Sempre que me convidam a opinar sobre casamento inevitavelmente me vem à cabeça taças de champanhe e cálices de vinho.Essas taças e esses cálices são os que ganhamos, minha mulher e eu, no dia do nosso casamento. Na lista de casamento, as taças e os cálices são os meus itens preferidos. Claro que geladeiras, por exemplo, são literalmente um presentão. E que presentinhos como tupperwares não são incríveis no estilo originalidade, mas são práticos, sim, e necessários e bem-vindos. Mas quem dá taças ou cálices não está se preocupando com a vida prática. Está, na verdade, investindo em comemoração, na alegria, no momento especial, no tintim.

Imagine um dia na vida de recém-casados. Eles despertam. Usaram, assim, os lençóis que foram presente da vovó. Tomam café usando as xícaras que foram presente de uma das sogras. Têm um longo dia de trabalho usando underwears que ganharam de um dos cunhados. Voltam para casa pensando no que vão fazer com o bendito conjunto de fondue que ganharam da vizinha. Ou, antes: onde enfiar a maldita racleteira do bendito conjunto de fondue. Ao chegar, tomam banho usando as toalhas que ganharam de um dos sogros. Logo depois do jantar (em que eles usaram as travessas que ganharam de uma das cunhadas), o casal coloca um CD (que era dele antes do casamento), acendo um incenso (que ela tinha desde que namorava outro cara) e bebe um vinho. Finalmente, comungam, um dando atenção a si e ao outro, um chegando a si e ao outro. Pois é nesse instante, breve se pensarmos nas muitas horas do dia, que o casal está convivendo com o presente de um grande amigo do peito: os cálices.Se o vinho e o papo forem bons, provavelmente os lençóis, presente da vovó, serão bem utilizados em seguida.

E o ciclo no próximo dia se repetirá, até um novo momento de paz, este, quem sabe, com champanhe e com o presente de uma grande amiga do peito: as taças.Taças e cálices são o que fazem o casamento não ser, argh, um matrimônio. E uma mulher não ser, argh, uma esposa. Mas se você está imaginando que o casamento me faz pensar em taças e cálices porque acredito que uma vida a dois não resiste sem doses de carinho, sem momentos de delicadeza, sem intervalos amorosos, isso é verdade. Mas não é toda a verdade.A verdade. O casamento também me faz pensar em taças e cálices porque casamentos duram, duram, duram e um dia essas taças e cálices começam a quebrar. Sim, quebra uma taça em um jantarzinho à luz de velas, quebra outra em uma festa de aniversário, quebra um cálice quando os dois, meio bêbados, se encaminham até o quarto, quebra outro por descuido, na pia da cozinha. E quebram várias e vários quando chegam os filhos. Assim, a gente vê ali, no armário da sala, a passagem do tempo. Nossa coleção de copos (difícil achar sinônimos para taças e cálices) vai sofrendo dramáticas e terríveis baixas... (repare: as fotos na prateleira também estão ficando mais desbotadas a cada dia).E ali na frente do armário, parado no meio da sala a gente se pega perguntando: apenas as taças e os cálices não resistirão à longevidade do casamento? O nosso frágil amor resistirá? Quebraremos nós também, eu um cálice, ela uma taça? Será que o tempo, implacável, exige que um homem, para continuar cônjuge. seja resistente e opaco feito um tupperware? E que uma mulher seja forte e fria feito uma geladeira? Não. Sinceramente acho que não.

Cacos didáticos?

As pessoas costumam dizer que vão perdendo as ilusões à medida que o tempo passa. E falam isso como se fosse ruim se desiludir. Perder ilusões é sabedoria. Ilusão é truque. Ilusão é mentira, ilusão é ilusão. Não acredita? Olhe no dicionário. Ou olhe pra vida. Amor é amor quando você prefere sua mulher a uma mera tapeação. Amor é amor quando você aprecia mais o seu homem do que um sonho dourado.É isso que o casamento ensina sobre o amor - ou ao amor.Quando você perde ilusões ganha na vida real. Em vez de ficar perseguindo uma quimera, descobre que já chegou, faz tempo a um bom lugar. A sua própria casa.

Sábios copos.

Por isso que o tema casamento me remete a taças de champanhe e cálices de vinho, às taças e aos cálices que ganhamos, minha mulher e eu, na festa de casamento. Esses copos chegaram a nossa vida em um dia de celebração. Depois, com o tempo, se revelaram parceiros sempre que a celebração, não importando o dia, voltava a tomar conta das nossas vidas. E então, esses sábios copos despediram-se na hora certa, a tempo de deixar bem claro que a celebração, afinal, não estava neles. Mas em nós, marido e mulher. A ponto de hoje em dia, o marido e a mulher estarem convencidos de que é preciso comprar taças e cálices novos para casa. Os deuses estão exigindo novos sacrifícios em nome da saúde desse casal. Precisamos fazer novos brindes, quebrar novas taças, estraçalhar novos cálices.

Transparências.

E como casamento também me remete a taças e cálices, casamento acaba me remetendo a transparências. Faz sentido.Quanto mais tempo duas pessoas convivem, mais elas ficam transparentes uma para outra. E isso não é ruim. Isso é amor."

Marcelo Pires

Os Macacos



"Cinco macacos faziam parte de uma experiência, trancados em uma grande jaula, com uma escada dobrável no centro e um cacho de bananas pendurado, bem ao alcance daquele que subisse a escada. Pois bem. Cada vez que um dos macacos começava a subir a escada, em busca da banana, os cientistas ligavam uma mangueira e lançavam um forte jato de água gelada sobre os outros quatro macacos. Depois de um certo tempo, cada vez que um macaco tentava subir a escada, era atacado e fortemente espancado pelos outros quatro. Até que ninguém mais pensava em subir a escada, por mais apetitosas que fossem as bananas. Então os cientistas substituíram um dos macacos. O macaco novato, ao ver as bananas, e a escada, e sem saber o que se passara anteriormente, foi direto em direção à comida. Tomou uma grande surra. Deve ter achado aquilo tudo muito estranho. Fez outras tentativas e foi surrado outras vezes. Até que desistiu. Os cientistas substituíram outro macaco. A história toda se repetiu. O segundo macaco substituto tentou pegar a banana e foi atacado pelos demais, inclusive pelo macaco anterior, que, por sinal, participou do ataque com grande entusiasmo (afinal de contas, deve ter pensado, agora eu faço parte do time dos vencedores!). E assim os cientistas trocaram o terceiro macaco, depois o quarto e por fim o quinto macaco original. E tudo se repetia. O macaco recém-chegado tentava pegar as bananas, era espancado pelos outros quatro, fazia outras tentativas, apanhava mais, até que desistia. Nesse ponto da experiência os cientistas tinham um grupo de macacos que nunca tinham sido atacados com jatos de água gelada. Entretanto continuavam batendo naqueles que tentavam pegar as bananas. Se os macacos soubessem falar e se alguém perguntasse "por que vocês atacam e batem em quem tenta se aproximar das bananas" a resposta certamente seria "Não sei. As coisas, por aqui, sempre funcionaram dessa maneira..."

A metáfora acima retrata bem a realidade humana. Mudanças são vistas com muitas reservas. Pessoas são desestimuladas a inovar, para não acabar com as arcaicas referências dos mais antigos.Por que não se pergunta o porquê de ser assim? Se poderia ser de outra forma...É... As pessoas se acomodam, mas não deviam. Afinal, a rigidez mental, o conservadorismo, o tradicionalismo, acabam por engessar a mente humana, privando-a da evolução, do aprimoramento.

Tenho justo receio de que, como os macacos, acabemos por nos esquecer das bananas.